domingo, 24 de abril de 2011

LUNA FERNANDES



REENCONTRO

Eu me afastei de mim, de tudo o que eu queria
-as minhas ambições, meus sonhos e ideais...
E sem sentir, decerto eu me afastei demais
desse mundo de paz e amor em que eu vivia.

E arrastado que fui por tantos vendavais,
eu me perdi de mim... E quando enfim, um dia,
eu tentei me encontrar, senti que não podia
pois os rumos de volta eu não sabia mais...

E segui, sendo alguém que seguia, não eu...
Até que um dia achei, entre as rimas, o abrigo
que eu há tanto buscava e tão bem me acolheu...

E aos poucos devolveu-me esse convívio amigo
com tudo o que eu perdera e voltava a ser meu...
E eu me encontrei, então, novamente comigo...


BRISA E VENDAVAL

No início era uma brisa, a deslizar de leve
e a carregar consigo o aroma dos rosais...
Passava sem fazer ruído nos beirais,
sem arrastar a areia ou derrocar a neve...

Depois tornou-se vento, aligeirou-se mais...
Já não passava assim -silencioso e breve...
Passou a ter um ar de quem ousa e se atreve
a chamar atenção e assustar os mortais...

Foi ficando mais forte, ameaçante e rude...
E hoje deixa antever, no porte e na atitude,
tudo o que pode ser e causar, ao final...

Pois não queira ir além de onde deve e precisa:
é melhor retornar à condição de brisa
que prosseguir e ser, um dia, um vendaval!...


NÃO MALDIGAS...

Não maldigas o amor do teu passado
nem maldigas a dor que já sentiste,
seja, embora, este amor que te fez triste...
Seja esta dor que tenha te marcado...

Não maldigas quem quer que, dedo em riste,
possa ter, muitas vezes, te humilhado...
Nem maldigas, por ter desmoronado,
o castelo de sonhos que erigiste...

E ao te invadir a mente, distraída,
qualquer recordação te desconforte,
de algum mamor desfeito ou dor sentida,

não a maldigas, pois, de alguma sorte,
foi, quem sabe, esse amor que te deu vida!...
Foi essa dor, talvez, que te fez forte!...


A GRANDE INCERTEZA

O que existe, afinal, depois da vida?
O céu?... O purgatório?... O inferno?... O nada?...
Uma outra vida, longa e atribulada
como essa que acabou de ser vivida?...

E o que é dado levar, na retirada?...
A semente plantada?... A flor colhida?...
A chama da paixão interrompida?...
A pauta da canção inacabada?...

Para onde... E por que... E como... E quando...
Vivemos, há milênios, perguntando
e ninguém nos responde com clareza...

Tolos e sábios, crédulos e ateus,
por mais que se confie e creia em Deus,
todos temos, no fundo, esta incerteza!...


ROSA PÓSTUMA

Sozinho a caminhar, descalço e maltrapilho,
um menino percorre a fatigante estrada...
Um menino sem lar, sem família, sem nada:
ninguém sabe quem é nem de quem é filho...

Apeesar da feição contraída e cansada,
não detém a passada o pequeno andarilho...
E a seguir, como um trem a seguir sobre o trilho,
vai cumprindo, a rigor, toda a meta traçada...

Uma rosa na mão... uma rosa colhhida
numa praça, talvez... E a expressão decidida
de quem sabe que vai, aonde vai e porque...

Passa o grande portão... Segue a aléia vazia...
E em frente à campa rasa, estanca e balbucia:
- Esta rosa, Mamãe, eu trouxe pra você!...



Luna Fernandes é brasileiro, carioca, casado, empresário, pós-graduado em Gestão Empresarial. Mais de cento e cinqüenta prêmios literários conquistados em todo o Brasil e em Portugal, em todos os gêneros – romance (dois romances premiados), contos, crônicas, poesias e trovas (detentor do título "Magnífico Trovador", outorgado pela UBT – União Brasileira de Trovadores). Participação em mais de cinqüenta antologias e coletâneas, com vários trabalhos traduzidos para outros idiomas (espanhol, italiano e esperanto). Três livros editados: Primícias (poesias, de onde foram extraídos os sonetos acima), Gurugumba (romance) e O Mundo do Curió (contos). Contato com o autor: lunafernandes@mundivox.com.br

2 comentários:

  1. "Muito antes é poeta aquele que inspira do que aquele que é inspirado." disse Paul Éluard . Gosto de poemas assim que levam à reflexão. Grato por compartilhar..
    Antonio - blog Poetas de Guarulhos
    http://poetasdeguarulhoseoutrosversos.zip.net

    26 de abril de 2011 15:53

    ResponderEliminar