domingo, 22 de maio de 2011

ISABEL FURINI





UMA TATUAGEM

Uma tatuagem é desdobramento do instinto em imagens,
orbe de conceitos
chicoteados em flor, ou âncora, ou astro (caos de imagens)
silêncio angustiante e selvagem cinzelado no corpo.

Uma tatuagem é labirinto de conceitos
(metálicos),
gravura de emoções desafiando a impermanencia
e os preconceitos,
áspera formiga desfiando um a crosta de um relógio vermelho
(no quadro de Dalí).

E, às vezes, às vezes, uma tatuagem
é como a fita de Moebius,
arco do tempo,
voz metafísica do universo
imprimindo o sonhos na epiderme do eu.












CAMPO DE TRIGO DE VAN GOGH (1890)

Corvos ferinos, mímicos ferinos,
sombras da genialidade,
murmúrio de rios subterrâneos,

canal das águas do inconsciente,
campo de trigo com negros corvos
moendo as tenebrosas horas.

O vento sussurra entre os ouvidos e a tela
- quase um ulular de morte.










A NOITE DE PEDRO PÁRAMO

Silencia o trovão amordaçado pelo árido deserto,
a noite macilenta
aprisionada pelas violentas gárgulas do rancor, arqueja.

Noite que alimenta sombras, matriz de espectros
que deambulam pela árida terra dos mortos.
Noite fantasiada de carranca de proa
naufraga em angustiados alfabetos.

(O abismal relato de Juan Rulfo penetra nos ouvidos
e na alma,
enquanto falanges descarnadas escavam lembranças.)

Nada se mexe no horizonte.
Nada se mexe nessa noite sem estrelas.
Noite de meninos mortos
enterrados em caixões brancos com arabescos.

Noite desabitada – sem esperanças, morta,
quase um contorno de casas em penumbra,
as portas uivam e quebram lúgubres sombras.

Sucumbe, verticalmente, a noite e impulsiona o vento
que arremete contra esse povoado poeirento e olvidado,
trancado entre paredes de espectros e de traumas.

Pedro Páramo espreita nossos passos
com seus olhos cruéis
transforma-nos em moinhos de pedra
e ficamos como estatuas avassaladas, inertes,
no árido deserto de Comala.






VIVÊNCIAS



Dedicado ao poeta Claudio Daniel.
Ele escreve poemas a partir de mantras.
(Om Lakshmi pataye namaha)

Palavras serpenteiam no vento entre ondas e incenso.
Sabores naufragam
no prisma da memória.

Nada escurece as lembranças de experiências
(antigas e futuras),
torrentes de emoções acordam
(e dançam),
clareia a noite cinzelada em rochas de palavras
(mantras)
clandestinos afetos invadem o castelo da alma
e a deusa dança sua dança
(infinita).

Om Lakshmi pataye namaha.






TULIPAS



Lateja a vida nos meteoros das cores e das formas.
A artista multiplica tulipas
no universo da tela,
e as flores alegram as retinas.






VAN GOGH



Ulula o chicote do tempo no vulcão das horas,


e no local absurdo,


tétrico, do porão da mente,


o brilho dos quadros


cinzela as noites de insônia.




Enquanto emoções disputam espaços,


a orelha - banida do tempo -impulsiona-se


para a eternidade.








ISABEL FLORINDA FURINI, escritora, palestrante, poeta premiada e educadora. Assina a coluna “Livros de negócios” do Jornal Indústria&Comércio de Curitiba. Mantém o blog Falando de Literatura no Bondenews (http://www.bonde.com.br/bonde.php?id_bonde=1-31-3&oper=quem). Escreve a coluna “Falando de Literatura” na revista ZK 2.0 da Espanha.
Já publicou 20 livros, entre eles: Arte de Falar em Público, Ele e outros contos, O Livro do Escritor, Oratória Forense.Em 2007, redigiu o livro: SENAC Paraná, 60 Anos.
Contato: isabelfurini@hotmail.com