quarta-feira, 30 de junho de 2010

EUNICE MENDES


AURORA GRIS

Ainda é quente a noite e não dormi
Olho lá fora e vejo uma Aurora Gris
Quase chove e ainda não há sol
Não sei se o que sinto é ser feliz
Ou não sei se sonho ou não dormi
O que dá no mesmo se me invento
Porque a verdade é também mentir
Nesse dia quase ainda noite nessa Aurora Gris
Neo me importa o tamanho nem o todo
Tenho aqui tudo que sempre ou nunca quis


SEDE DE AMOR

A tua sede de amor
Quis beber do meu corpo e alma
E depois naufragou

Teci uma rede de sonhos
Que te enredou
Era tanta água, tanto amor...

Tua alma tudo suportou
Tantas vagas, tanto abismo
Tanta dor e, depois, a calma

Tudo em ti foi essa sede
E esse amor
Tudo em mim, a rede

Feita de sonho invisível
Que nesse mar se perdeu
Que nesse mar transbordou...


***

tudo o que faço
já não parece meu
de mim se desprendeu
feito um laço

nó esgarço
pelo tempo

***

minhas saudades
enchem um poço de lágrimas

dentro dos meus olhos
já se pode ver o fundo
refletido nas estrelas
pontilhado de escuros

***

porque
essa pressa de paisagem
em janela de trem

porque esses olhos
prenhes de saudades

porque a vida é um fato
e há sonhos sob as casas:
telhados amontoados
pontilhados de verdura e esperanças
vestígios humanos
onde cantam galos
e água escorre em torneiras enferrujadas
mãos ensaboam trapos
alisam, enrugam, secam
repousam sobre parapeitos ásperos
cobertos de musgo
e crostas de sujeira secular

porque olhos baços, quase cegos
desafiam nuvens
olhando ausentes para o nada.

e eu aqui,
ocupada em sentimentos.


***

não existem mais
as carambolas
cortadas feito estrelas
flutuando leves e aguadas
dentro das jarras de vidro
debaixo dos arvoredos
verdeamarelos de minha vó

nem as mãos
da mulher que as cortava
sobre a mesa de madeira lavada
e nem o seu prolongamento
dentro dos meus olhos
nem a faca
afiada

apenas sonhos
trocados
como olhares
feitos de memórias perdidas
de outros lábios contadas
de outros olhos
fechados
permanecendo acesos
-antepassados


***

derramei meu amor num leito
desprovido de sonho e sentimento
-depois, entreabri meu peito
para que lhe açoitasse o vento

meu coração ainda pulsa aberto
pelos vestígios deixados dentro
pela amplidão vazia do deserto
que o eterno alijou do tempo

o amor sobrevive intrínseco
adormecido nas areias quentes
mas meu peito vai ficando seco
e minh’alma se deixando ausente

beberei águas de fontes frias
para saciar a sede dos desejos
serão sombras do sonho onde ias
naufragar tua boca nos meus beijos

depois terei tudo perdido
o verdadeiro espírito, escondido
o paraíso interior todo desfeito
e uma pedra bruta dentro do peito


***

naufragas perdido nos mares

e tens as duas mãos feridas
te agarras nas pedras frias
te açoitam as franjas dos ares

tudo é uma batalha perdida
a morte te espera na praia
tua alma deserta e vencida
pelos amores desfeitos desmaia

quimeras perseguidas em vão
são tuas ilhas ausentes
são céus que inventas, são pão
são tua porção de sementes

são teus olhos no horizonte
cegos de tanta ilusão
são nuvens sobre os montes
fugindo na imensidão

são outros mundos silentes
cobertos de bruma e flores
são abraços e beijos quentes
numa cumplicidade de amores

naufragas perdido nos mares
mas tens um leme nas mãos:
os céus para te abraçares
e os teus sonhos por chão


***

tudo o que faço
é sonho
tudo o que teço
recomeço

tudo o que peço
é nada
tudo o que tenho
é tudo

só quero ser
quem não sou
só quero ter
sossego e saber

tudo o que cedo
esqueço
tudo o que dorme
amanheço

quem me vê
um pedaço
não me sabe
inteira


***

existe sempre
duas coisas acontecendo
ao mesmo tempo
uma por fora
outra por dentro
e um único jeito
de atravessar a ponte:
de mãos dadas
com o nada

e deixar guardadas
as outras formas
de expressar o sonho
primeiro por fora
depois por dentro
e tudo será somente
: ausência


***

meus olhos
perdidos
na paisagem
embebidos
na miragem
sem fundo
de um poço

atração do abismo
frescor de aragem
paixão cega de um sonho

horizonte que se alarga
e me abraça
como céu que se espraia
sobre a secura da terra


***

minha vida
não erra
por salas de espera

minha vida
se atira
pelas janelas


EUNICE MENDES: formada em jornalismo, possui vários livros organizados e tem poemas publicados em vários fanzines, revistas e jornais de todo o país. Também edita a folha poética A POETISA.

WALMOR DARIO SANTOS COLMENERO


OSCULÁRIO
À Eunice

No ósculo há o deserto das palavras,

imagens que o tempo não guardou,
espelhos que refletem muita história,
vitória vencida que ficou...
No corpo, vago, virgem de desejos,

segredos das lembranças
restaram sonhos, cores, beijos...
O amor que, enfim, se transformou.
No ósculo livre da imagem,

passagem que em mim desembocou,
é o rio que passou como viagem
na flor floriu, desabrochou...


LONGE...

Guardo ainda comigo na memória
um pouco da saudade,
do amor,da vitória de um bem,
do olharque se tem ao se encontrar.
Ainda tenho, apesar dos anos,
os adeuses que foram ditos,
amores esquecidos,
lembranças malogradas.
Restam o consolo, o alívio,
o suplício, o sorriso e tudo.
A vida que insiste,uma boca,
um desejo, uma inspiração,
pois longe é muito longe e deixa mudo,
mas ainda é um lugar que não existe.


CIRANDA
Para Luiz Antônio Martins Pimenta

Do artista fica a arte.

Da arte fica a essência.
Da essência fica o sumo.
Do sumo fica o suco.
Do suco fica o sabor.
Do sabor fica o prazer.
Do prazer fica a vontade.
Da vontade fica o conhecimento.
Do conhecimento fica a palavra.
Da palavra fica o poeta.
Do poeta fica o artista.


RÉQUIEM III
Para Teresinha Tadeu

A negra lambe as feridas da alma
e cospe na cara do ouvinte, do leitor.
Cospe e ri.
Ri com sua cara gorda e cheia de dentes.
A negra grita com instintos de loucura
na sanidade da vida turbulenta,
com seu mundo vazio,
objetos de desejo
com lampejos de poesia racional.
A fome que percorre o seu estômago
é a fome do mundo e ninguém sabe...
A tampa de margarina serve de arte,
na arte louca das ruas,
na comida velha colada na roupa.
A negra enegrece o mundo com sua poesia crua,
sem pieguice, sem rótulos, sem amores sutis.
É apenas poesia.
Lá vai na memória
a negra que gostava de ser negra.


POEMA DA MANHÃ DE UM NOVO DIA

O novo dia está aí,
o teu rosto vem beijar-me a face,
retratos que mostram o que vivi,
o teu longo e caloroso enlace.

Há nos teus olhos a juventude esquecida,
os tempos passados nos segredos,
longínquas eras, alegria perdida,
ou quem sabe conhecer seus medos.

Não importa! Quero fazer esse poema do dia,
esse mesmo que o vento levou,
certa vez, no lugar que escrevia,
teus olhos pousaram no meu olhar que restou.

O silêncio! Aquele que tua boca ao me dizer
pronunciou, esperando um só achado,
o lacre dos segredos do viver,
quem em tua boca há de ter ficado!


UM MOMENTO

O hálito da noite percorre o meu corpo e o teu,
habita em mim o nosso sabor de vida que é meu,
que existe em seu olhar de desejos.
Semeio a tua felicidade
e a tua liberdade
coroada de beijos.
A noite é nossa e da lua.
A vida é bela e é tua.
O coração é do cristal mais puro
a passear pelos campos da memória,
tendo ao vento o sabor da tua vitória
e ao teu lado o segredo do futuro.
O hálito da noite não é mais tão sufocante,
tem o cheiro e o enigma dos amantes,
os mistérios que guardo no retrato depois.
Retrato este que cultivo aqui no peito,
que se confunde com teu rosto, desse jeito,
que se inicia na viagem de nós dois.


MINHA CASA

Minha casa tem canteiros
com begônias que eu plantei.
Minha casa tem amores
de amores que eu nunca dei.
Minha casa tem um velho
solitário que ainda vive.
Minha casa tem lamentos
retratos que eu nunca tive.
Minha casa tem janelas e vidros de algodão,
Tem pomares, tem flores feitas de coração.
Minha casa tem as cores
todas de tom bem forte!
Engraçado!
Minha casa não tem cheiro de morte.
Ah! Minha casa tem lugares
que ainda não conheço.
Minha casa tem esquinas
por onde quase padeço.
Minha casa tem artistas
cada qual tem seu papel. Qual serei?
Ah, minha casa tem saudade
dos sonhos que não sonhei.


SIMETRIA

A João Cabral de Melo Neto

Pedra e rio se confundem.
Lama. Pó. Sujeira. Pau.
Sonhos do norte se distendem.
Força. Solidão. Arrebol.

Faca e lâmina se afiam.
Som. Faísca. Fogo. Flor.
Símbolos de mentes se definem.
Sangue. Poeira. Vento. Cor.

Boca e voz a trabalhar.
Canto. Fato. Estribilho.
Choro e chuva faz calar.
Corpo. Esqueleto. Nosso filho.

Tudo é mistura nessa lida.
Vida. Morte. Sentencio.
Pobre morte. Pobre vida.
Toda dor tem um silêncio.


POEMA SEM TÍTULO II

Meu canto é como a água de um rio,
corre lento e mansamente,
povoa todas as frestas,ara todos os terrenos
e morre na seiva da terra.

Meu canto é como a água do planeta,
vive no vão das coisas,
nos mares bravios,
na plantação, na colheita,
na folhagem, no plantio.

Meu canto é como a água em que se banha,
é chuva, é cascata,
cobre tudo tipo mar,
despe toda alma impura,
causa amor, causa fartura,
na terra que semear.


WALMOR DARIO SANTOS COLMENERO, autor de "Um Poeta na Rua" e vários livros artesanais. Tem alcançado vários prêmios e menções honrosas em concursos de poesia em âmbito nacional. Em 2004 foi um dos finalistas na fase regional do Mapa Cultural Paulista. Tem poemas publicados em vários fanzines, entre eles: www.gargantadaserpente.com, além de co-editar a revista Poetizando, é editor da folha poética O POETA e do fanzine ESCRITOS. Também edita os blogs: www.revistapoetizando.blogspot.com. www.fanzineescritos.blogspot.com

terça-feira, 8 de junho de 2010

DALMO SARAIVA





DE JOSÉ A JOSÉ

José de Alencar! José de Alencar!
Por que deixastes Iracema sob o sol
Naquela praia do Ceará?
José de Alencar! José de Alencar!
E o guarani bebendo guaraná
Pensando que era maracujá?
José de Alencar! José de Alencar!
E o Perí ficando a perigo
Olhando para as pernas de Ceci?
José de Alencar! José de Alencar!
Enquanto isso Monteiro Lobato
Sentado numa tábua em Taubaté
Colocava o saci em suas fabulosas fábulas.
José de Alencar! José de Alencar!
E Carlos Drummond de Andrade
Sentado na praia de Copacabana
Escrevendo com o caldo de cana a palavra liberdade.
José de Alencar! José de Alencar!
José de além!
José de além!
José de Alencar!



SONHO E REALIDADE

Equilibro. Equilibro-me. Sei que já atravessei um século e estou num outro. Outro muito perplexo assim como eu. E o amanhã? O amanhã é esse hoje onde faço a massa e monto o alicerce para depois virar picumã em cima de um fogo. E se derrubo portas é para renovar a entrada. E se entro é para buscar uma saída. E se saio é porque não tive que derrubar janelas. Livre é todo aquele que nada tem a dever, mas tem o dever de esticar as asas sem mandar nenhum telegrama avisando que as horas também são prisioneiras do relógio de pulso ou de parede. Muitos riram de mim enquanto eu construía o meu circular por cima dos montes. Estiquei o círculo e cortei todos os nós. Voei. É claro que voei e ninguém viu quando pousei nos telhados de vidro. Fiquei lá em cima e não tive pressa porque tudo que flutua, um dia pode retornar ao chão. Acendi fogueiras. Fiz sinais. Conversei com a tal de intuição. Pedi licença ao dia para me despedir da noite. Dormi sob o teto de milhares de estrelas para depois acordar mais ameno e humano. Uma maneira de falar apenas o necessário diante das pedras. Com as pedras aprendi aceitar as perdas porque nada mais tenho para ganhar além da vida que me deram. Pinto de azul esta escrita que não deixa de ser uma fantasia e não deixo de dar uma pitada de realidade diante de tudo que vejo e vivencio. E amanhã quando eu esticar essa corda bamba, possa passar por cima dela sem pressa e lá adiante dizer que valeu a pena
misturar sonho com realidade. É que todas as manhãs eu acordo com o sonho na cabeça e a realidade nos pés. E se essa vida é uma caixa de segredos, ela está sem trinco e sem tramelas. Nada mais posso fazer além desse viver.
É o suficiente. É o SUFI ciente.


PEDRAS DE VIDRO


Aprendi muitas coisas
No curso dos rios.
Amarrei outras coisas
Nas linhas das palmas das mãos.
Com o pé de vento aumentei
Mais ainda os meus passos
Para poder me agarrar
Nas barras da vida.
Com o olho d’água
Comecei a enxergar melhor
As pedras de vidro
No espelho da alma.


COMUNHÃO

Ajuntar amigos, não correr perigos;
Deitar no mato, não desafiar o tempo;
Semear a voz, colher palavras;
Cortar o mal, viver o bem;
Andar sem rumo, buscar uma direção;
Fechar os olhos, abrir a visão;
Sentar no deserto, imaginar uma floresta;
Beber a água, irrigar plantações;
Sentir o medo, avançar com coragem;
Se perder no dia, se achar na noite;
Naufragar no mar, descobrir oceanos;
Rasgar o pano, fazer um manto;
Cortar a terra, descobrir o universo;
Unir o verso, formar um poema;
Agrupar crianças, educar os homens;
Apanhar da vida, morrer tranqüilo;
Colher a fruta, plantar a semente;
Filtrar o sono, dormir tranqüilo;
Sonhar com a guerra, acordar em paz.


*********
De dia é amante.
De noite é diamante.
Estrelas e folhas secas.


*********
Não leve para um Shopping
O meu nome.
Deixe na porta o sobrenome.
Divida aquilo que te sobra
Com quem não come.


*********
Eu vi um braço do mar
Chupando manga de camisa.
Zeus fez chover canivete
E Moises pintou o mar de vermelho
Na tabua das marés.


*********
Há uma criança
Dentro de um homem.
Há um homem
Dentro de uma criança.
Ambos passeiam e sonham
Vestidos de gente.


*********
Venho dos sonhos distantes,
Das nuvens, dos desertos.
Venho de onde
Os ventos resmungam
Das curvas, dos rochedos.
Venho das asas dos pássaros,
Os de dois bicos, de três asas.
Venho das passadas largas,
De lugares estreitos, o claro.


*********
A nossa história
É cheia de geografia.
Somos andarilhos
Andantes andinos.


*********
A grande cidade
É a capital do Estado.
O estado de nervo.
O estado de sítio.
O crime organizado.
A guerra civil.


*********
O branco no preto.
O preto no branco.
Café com leite.
Ninguém mistura
A água e o azeite.


*********
Com o peso de meus erros
Rasguei a terra.
Me vesti de carne e osso
E caí no mundo
Guiado pelo meu pescoço.


*********
Lampião e lamparina.
Um explode a tocha.
O outro é a luz que ilumina.
O raio do corisco.


*********
Quase todos os poetas
Morrem cedo.
Eu prefiro morrer
À tarde para poder
Pegar o sol da manhã.


*********
Passarinho na gaiola canta
Porque não sabe chorar.


*********
O plural de deu
Não é deram.
É Deus.
O resto é singular.




Dalmo Saraiva (Rio de Janeiro) é um artista múltiplo: jornalista, escritor, poeta, teatrólogo e pesquisador, com destacada atuação em grupos de arte popular. Já publicou “Urubu” e o livreto “Zoiudo foi pro Beleleu”. Publica regularmente o folheto “Feijão com Arroz” e tem pronto pra publicar o livro “Santo de calça não faz vinagre”.

MARIA ROMANA


ALGO QUE NUNCA CHEGA

No crepúsculo do fim de tarde,
O sol aproxima-se do acaso
E a luz, já sem fulgor,
Lentamente se desvanece.
A noite aparece,
Com ela o mistério e a incerteza.
Quantas vezes, no silêncio da noite,
Alguém circula sem rumo certo,
Procurando um bem impossível,
Um “canto” onde possa repousar
O corpo “mal tratado”...
Encontrar
Um companheiro, um amigo,
Para desabafar as penas da solidão...
E, circulando, sem direcção,
O crepúsculo da manhã aproxima-se,
Semelhante ao da tarde;
A alvorada começa a despontar,
O sol surge no horizonte,
Estamos em pleno dia;
Novamente surge a noite.
A cena repete-se.
Os dias e as noites sucedem-se
E alguém espera algo... que nunca chega!...



DESILUSÃO!...

Eu queria ser algo com suporte,
Mas sou humilde rio, deslizando...
Por entre altas vertentes, vou rumando
Nas esp’rança de alcançar inda o meu norte!
Queria a liberdade de um Oceano,
E ser a magnitude, a Terra imensa,
Um sonho sublimado de presença
Num mundo transparente e mais humano!
E não a triste imagem conturbada
Que perdeu robustez, toda a harmonia,
E doces sortilégios de magia...
Agora vejo nada –igual a nada!
Porque sou linfa turva obstruída,
Quando queria ser a claridade
E ser na própria essência, na vontade
O Mar deste universo e a cor da Vida!



LÍNGUA... MATERNA

Minha língua materna é portuguesa
E é por excelência soberana;
Camões a enalteceu... lhe deu beleza
Ao escrever a heróica “Lusitana”!
E por ser valiosa e com rigor,
Sublimou a nobreza do seu povo
Que no mundo alcançou real valor...
Mas foi adulterada... e eu reprovo
A forma como está a ser tratada
Sofrendo de “pobreza”... e quem se importa?!
A língua que era rica, bem falada,
Anda agora a pedir de porta em porta!

O idioma firme, em meu país,
Ref’renciava o estilo e argumento
E o gosto p’la leitura era a matriz,
Em obras de escritores... com talento:
Guerra Junqueiro, Eça de Queirós;
Garrett e Herculano... e na memória
João de Deus, que dera a meus avós
A luz da “aprendizagem obrigatória”...
Araujo Correia e o Pessoa
Fizeram da palavra algo divino!...
Por isso, em meu ouvido ainda soa
A língua que aprendi em pequenino!



O MEU RITUAL

Eu sou humilde rio, descuidado,
Trilhando por vertentes de euforia;
E envolve o meu caudal tão delicado
A esp’rança de encontrar paz e alegria!

Meu vigor para o mar vai ser lançado
A fluir os murmúrios da harmonia
E sorrindo ao porvir que é desejado,
Emerjo nas enchentes... dia a dia!

Faço do meu destino um ritual
Correndo com a força natural
Na plena transparência, da minh’alma!

Por ser a minha essência a própria vida,
Sou água firme, activa na subida,
Descendo p’la corrente que me acalma!



OH TEJO, MEU RIO FAMOSO! ...

“OLHA, O TEJO VAI TÃO TRISTE”,
Por já não ser o que era
Pois, agora, nele existe
Um mal que o desespera
“A CORRER TÃO VAGAROSO”
Não tem pressa de chegar
Ao ponto mais arenoso
E a vida não encontrar.

“OLHA, O TEJO VAI TÃO TRISTE”,
Vai carregado de mágoa,
Porque o mal, ali, persiste,
Poluindo a sua água.
“A CORRER TÃO VAGAROSO”
Por não ser aquele rio,
Imponente e poderoso
E que, outrora, ali sorriu.

“OLHA, O TEJO VAI TÃO TRISTE”,
E também suas gaivotas;
Algo cruel não desiste...
No escuro das horas mortas!
“A CORRER TÃO VAGAROSO”
Murmuras já, sem alento
Como eu, audacioso
- Chora, agora, o sofrimento.

“OLHA, O TEJO VAI TÃO TRISTE”,
Coberto de chicotadas
A vida ali não resiste
Nas águas tão perturbadas.
“A CORRER TÃO VAGAROSO”
E o coração destroçado,
Oh Tejo, meu rio famoso
Que tormentas tem passado!...



Maria Romana da Costa Lopes Rosa, natural de Tavira, residente em Faro, Portugal. Membro de várias Associações, algumas como sócia fundadora – Academia Antero Nobre; Ajea (Associação de jornalistas e escritores do Algarve) ; Clube da Simpatia; Associação dos Antigos Alunos da Escola Secundária Tomás Cabreira e Elos Clube de Faro; Sociedade Portuguesa de Autores; Direcção dos Espectáculos de Lisboa, Concorre a Concursos Literários… tendo sido distinguida em prosa e verso – crónico, conto e soneto… Grande apreciadora, entusiasta e divulgadora de novos poetas brasileiros na Europa.