segunda-feira, 26 de julho de 2010

WHISNER FRAGA




ROTEIRO PARA EDIFICAR O NADA

De romãs e jabuticabas
De traquinagens e pipas
A lápide grita nossos nomes grafites
E não fizemos que abandonar
Limpar as cinzas
Remeter compassos ao beijo retido
Implorar lembranças
E fui entre o barro e o cimento
Carpir abatimentos e derrotas
E suspirar
De tanto laço que é feita a perda
E a dor é erguer vazios
Entranhar dissonâncias
Degredar a busca de dois
E é por isso
Apenas.


PARA COMPREENDER SAMAMBAIAS

E pregos.
Raciocinar semelhanças
Desbotar empecilhos e respirações
Naufragar ocos e gentilezas
E inutilidades
Orgulhar alçapões de papel
Lustrar lágrimas de árvores
Condenar pequenezas
E imensidões
Lamber deuses de açúcar
Rastejar esperanças
Abraçar sóis e muros
Alcançar destinos
Ou iniciar trajetos
Ribombo de sistros
E depois se calar
Feito sopro de beija-flor.


PARA ESCOLHER FORQUILHAS

Optar pelo galho mais alegre
De goiabeira de fim de cinza
De noite arredia
E sacis xeretas
Enfim se decidir pelo corte:
Improvável cumprir completo a vida
Esticar braços condoídos
Para teste da melhor goma
E divertir dos amigos
A penúltima manhã amarela
Não alvejar canários ou azulões
Nem estrelas
Acolher o travesseiro o estilingue
Ao presságio de outras guerras.


INVENTÁRIO

Um peão de acaju
Uma jamanta e treze carrinhos
Palpitar incômodos
Um deslize
Duas histórias de amor
Uma discussão com o melhor amigo
Um videogame Atari
Vinte e cinco contos inacabados
Três cadernos de rascunhos
Duas begônias pisadas
Oprimir mágoas
Um coro
Hino nacional, da bandeira, da pátria
Aritmética da Emilia
Uma lapiseira verde metálico
Horas ultrapassando coisas
E dias a perder de conta.


AO REVELAR PARA-SEMPRES

Cabe-me a tutela dos répteis.
Entrelaçar aços e trigos
Percorrer tranças
E anelos sustenidos
Metamorfosear garatujas
(amor delineia esconderijos)
Palpebrar lábios
Sibilar madrugadas
Quando porém ceder.


RECEITA PARA DESORDENAR AS ESTRIAS DO DELÍRIO

O bom-gosto da vingança sob o gesso do desespero
A traição que rasteja nas barras das sobrancelhas
As invisibilidades tardias
O vento desmascarado pela poeira
O colarinho malpassado do idealismo
A avenida Brasil empestada às cinco da manhã
Um tumor de buzinas arruína o parto da luz
E a seiva da perda engravida fatalidades.


Professor, autor de A Cidade Devolvida, O Livro dos Verbos, O Livro da Carne, As Espirais de Outubro e Abismo, o audaz e inovador Whisner Fraga é um dos mais consistentes nomes da Literatura Brasileira contemporânea, vencedor de inúmeros – e importantíssimos- certames literários. A cada novo livro lançado, a certeza de que sua vasta obra encaminha-se para a posteridade. Que o digam seus fiéis leitores.

2 comentários:

  1. Está ficando cada vez melhor, site altamente recomendável.

    Grande abraço

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  2. Poemas magníficos; cada um deles parece pretender-se mais fantástico que os outros. Palavras escolhidas a dedo- colocadas com exatidão, sem redundância-, imagens ousadas, belíssimas. De ler os títulos já engravidamos.

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